2.2 - Drogas antidepressivas
fonte: http://www.ufrgs.br/Psiq/Caballo%206_8.pdf
Aristides Volpato Cordioli - Prof. Adjunto de Psiquiatria e Medicina Legal da UFRGS, Doutor em Psiquiatria
Na atualidade existe uma grande variedade de antidepressivos, que são classificados em razão da sua estrutura química ou do seu mecanismo de ação: tricíclicos e tetracíclicos, inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), inibidores da monoamino-oxidase (IMAO), inibidores duplos, etc. Continuam sendo chamados de antidepressivos embora estejam sendo utilizados cada vez mais em outros transtornos como no transtorno do pânico, obsessivo-
compulsivo, de ansiedade generalizada, de estresse pós-traumático, etc.
2.2.1 - Tricíclicos
2.2.1.1 - Indicações e contra-indicações
Os antidepressivos tricíclicos (ATC) vem cedendo espaço para os ISRS em raqzão do seu perfil mais favorável de efeitos colaterais.
Os ATCs são considerados por alguns como as drogas de escolha em depressões graves e em pacientes hospitalizados. Além disso, são efetivos no transtorno do pânico
(imipramina e clomipramina), no transtorno de ansiedade generalizada (imipramina) (Rocca et al.1997), na dor crônica: (amitriptilina), no déficit de atenção com hiperatividade (imipramina), e no transtorno obsessivo-compulsivo (clomipramina) (De Veaugh-Geiss et al 1991; Picinelli, 1995, Greist et al, 1995 ).
São contra-indicados em pacientes com problemas cardíacos (bloqueio de ramo, insuficiência cardíaca) ou após o infarto recente do miocárdio (3 a 4 semanas), em pacientes com hipertrofia de próstata, constipação intestinal grave e glaucoma de ângulo estreito.
Devem ser evitados ainda em pacientes idosos pelo risco de hipotenção postural e conseqüentemente de quedas, e em pacientes com risco de suicídio, pois são letais em overdose. São também contra-indicados em obesos, pois provocam ganho de peso.
Em pacientes com mais de 40 anos é recomendável que antes do seu uso seja feito um eletrocardiograma. Deve-se iniciar com doses baixas (10-25mg/dia), para o paciente adaptar-se aos efeitos colaterais. Na depressão são efetivos com doses diárias acima de 75-100 mg.
2.2.1.2 - Efeitos colaterais e reações adversas
Os tricíclicos atuam sobre diversos tipos de receptores: bloqueiam a recaptação da norepinefrina, da serotonina, e possuem afinidade por receptores colinérgicos, histaminérgicos, e adrenérgicos (alfa1), razão pela qual apresentam uma grande variedade de efeitos colaterais (Glassman 1998; Stahl, 1997). Os mais comuns são boca seca, constipação intestinal, retenção urinária,
visão borrada, taquicardia, queda de pressão, tonturas, sudorese, sedação, ganho de peso, tremores.
2.2.1.3 - Uso clínico e doses diárias
O efeito antidepressivo é dose dependente, razão pela qual deve-se tentar utilizar pelo menos as doses mínimas diárias recomendadas conforme especificadas na tabela 2. É usual começar-se com doses baixas incrementando-se a cada 2 a 3 dias, até se atingir as doses recomendadas para permitir a adaptação do paciente aos efeitos colaterais. Cuidados especiais devem ser tomados com pacientes idosos, debilitados ou cardiopatas.
Tabela 2 - Antidepressivos tricíclicos
Drogas Doses diárias
Imipramina (Tofranil ) 100-300
Clomipramina (Anafranil ) 100 - 250
Amitriptilina (Tryptanol ) 100 - 300
Nortriptilina (Pamelor ) 50 - 200
Maprotilina (Ludiomil ) 100- 225
Doxepina (Sinequan ) 100-300
2.2.2. - Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina
Com o objetivo de obter medicamentos com menos efeitos colaterais, que fossem mais específicos na sua ação neuroquímica, e conseqüentemente melhor tolerados, foram desenvolvidos especialmente a partir do início dos anos 90, os chamados inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS),
os quais progressivamente vêm ocupando o lugar dos tricíclicos, em razão do seu melhor perfil de efeitos colaterais.
2.2.2.1 - Indicações e contra-indicações
Além de serem utilizados na depressão unipolar, os ISRS se revelaram eficazes no transtorno obsessivo-compulsivo (Greist et. Al. 1995; Picinelli et al. 1995), no transtorno do pânico (Rosenbaum et al. 1996; Pollack et al.1998), na distimia, em episódios depressivos do transtorno bipolar, na bulimia nervosa (fluoxetina em doses elevadas), na fobia social (fluoxetina, paroxetina, sertralina), na ansiedade generalizada (paroxetina) (Rocca et al. 1997; Lydiard et al. 1998;.Stein, et al. 1998; Rickels et al. 2000; Gorman, 2003), no stress pós-traumático (sertralina) (Landborg et al.2001)
Estão contra-indicados em pacientes com hipersensibilidade a estas drogas, ou com problemas gastrintestinais como gastrite, ou refluxo gastro-esofágico. Pacientes que utilizam múltiplas drogas devem evitar a fluoxetina pois ela apresenta interações medicamentosas bastante complexas. Devem ser evitados ainda em pacientes que apresentam disfunções sexuais não decorrentes de depressão, pois podem agravar estes quadros.
3.2.2.2. - Efeitos colaterais
Mais comuns: ansiedade, desconforto gástrico (náuseas, dor epigástrica, vômitos), cefaléia, diminuição do apetite, disfunção sexual, inquietude, insônia, nervosismo,tremores (Kennedy et al. 2001; Fava, 2000; Fava et al.2002; Montejo-Gonzales et al.2001).
3.2.2.3 Uso clínico e doses diárias
Os antidepressivos ISRS são mais bem tolerados que os antigos tricíclicos, e por este motivo, nos quadros depressivos, pode-se iniciar com a dose mínima recomendada conforme a tabela 3. O efeito terapêutico não é dose dependente. A reação adversa mais comum é a náusea: por este motivo recomenda-se a ingestão destas drogas durante ou logo após as refeições.
Tabela 3 Antidepressivos ISRS e doses diárias
Droga Doses diárias em mg Fluoxetina (Prozac ) 20-80
Sertralina (Zoloft) 50-200
Paroxetina (Aropax) 20-60
Citalopram (Cipramil) 20-60
Escitalopram (Lexapro ) 5-20
Fluvoxamina (Luvox ) 100-300
3.2.3 - Antidepresivos diversos
Uma variedade de substâncias com diferentes mecanismos de ação, além dos tricíclicos e ISRS são utilizados no tratamento da depressão e eventualmente em outros transtornos psiquiátricos (tabela 4).
Tabela 4 Antidepressivos diversos: doses diárias e mecanismos de ação
Droga Doses diárias em mg Mecanismo de ação
Amineptina(Survector) 100-400 Inibição da recaptação da DA.
Bupropriona (Wellbutrin )200 - 450 Inibição da recaptação da NE e DA
Fenelzina (Nardil) 15-60 Inibição da monoamino-oxidase
Milnaciprano (Ixel) 50-100 Inibição da recaptação 5HT e NE
Mirtazapina (Remeron) 15-60 Facilitação da transmissão 5HT e NE
Moclobemida (Aurorix) 150 600 Inibição da MAO reversível
Nefazodona (Serzone ) 200-600 Inibição da recaptação 5HT e NE, e
bloqueio 5HT2
Reboxetina (Prolift) 4-12 Inibição da recaptação da NE Tianeptina (Stablon) 25-50 Aumento da recaptação de 5HT
Tranilcipromina (Parnate)20 60 Inibição da MAO
Trazodona (Donaren ) 75-300 Inibição da recaptação 5HT e NE,
bloqueio 5HT2
Venlafaxina(Efexor) 75-375 Inibição da recaptação 5HT e NE
A bupropriona é utilizada em dependência química como auxílio na interrupção do tabagismo.
A nefazodona e a mirtazapina têm um efeito sedativo bem marcado, e eventualmente são preferidas em quadros depressivos acompanhados de ansiedade. A nefazodona, a mirtazapina, e a bupropriona em princípio não causam disfunções sexuais. A venlafaxina vem sendo largamente utilizada no tratamento da ansiedade generalizada (Rickels et al.2000; Sheehan, 2001) .
3.3 - Farmacodinâmica e mecanismos de ação dos antidepressivos
Todos os antidepressivos afetam os sistemas serotonérgicos (5HT) ou catecolaminérgicos (dopamina ou norepinefrina ) do sistema nervoso central, seja por bloquear a recaptação pré-sináptica, estimular sua liberação na fenda, inibir seu catabolismo (IMAO) ou por efeitos agonistas ou antagonistas nos receptores (tabela 4).
O aumento da disponibilidade destes neurotransmissores na fenda sináptica é imediato, mas o efeito clínico em geral demora várias semanas, e correlaciona-se com um outro efeito neuroquímico: a down regulation de autoreceptores pré-sinápticos, responsáveis por modularem a liberação dos neurotransmissores na fenda sináptica.
É importante assinalar ainda que a ação da maioria dos receptores está ligada à proteína G, substância envolvida numa cascata de eventos intracelulares relacionada com a síntese protéica, como a transcrição genética.
Postula-se que através da ação prolongada dos antidepressivos sobre os receptores haveria uma modulação da proteína G e de outros sistemas de segundos mensageiros, e uma alteração na conformação dos novos receptores na medida em que forem sendo sintetizados, tendo como resultante a sua dessensibilização, a qual poderia contribuir tanto para a ação terapêutica dos antidepressivos como para o desenvolvimento de tolerância a muitos dos seus efeitos colaterais(Stahl, 1997; Reid et a